José Sócrates derrotou Passos Coelho . E agora?
"1.Em primeiro lugar, no ambiente de pré-debate, salientamos a presença de manifestantes pró-PS e pró-PSD junto às instalações do canal de televisão do debate. Bem sabemos que não é um episódio inédito - provém de outros tempos, de outras eleições. Contudo, é uma tendência que deve ser evitada: claques do PS e claques do PSD a gritarem o nome do líder antes do debate é, no mínimo, ridículo. Legítimo - mas quase patético. Parece que a política - ou seja, a definição das grandes questões nacionais - é um jogo de futebol, em que se deve prestar apoio moral aos jogadores antes da partida! Levemos a política a sério.
2. Dito isto, vamos à análise do debate:
a) Sócrates começou o debate atacando, tal como previ. Passos coelho respondeu bem, invocando exemplos de Cameron e do partido trabalhista para refutar críticas relacionadas com a sua idade e inexperiência. Ficou, no entanto, aquém na defesa do Estado Social e no seu entendimento do papel do Estado. Foi muito redondo, muito lento, muito pouco claro. José Sócrates deu uma imagem -televisivamente - muito mais tranquilo, mais confiante. Passos Coelho mais nervoso - tremeu quando pegou nos papéis - , mais tranquilo, sobretudo num momento importante do debate: a menção de um relatório da Fomtinvest que alegava que a crise nacional era, em grande parte, consequência da crise internacional. É a confirmação de que José Sócrates é um bicho político terrível: recorreu a um documento da vida profissional de Passos Coelho para o entalar politicamente. É um golpe baixo, mas politicamente útil. Até porque a imagem televisiva mostrou um Passos hesitante na resposta e invocou um argumento político frágil: é que, enquanto administrador, tinha uma certa visão; enquanto líder do PSD tem outra. Ora, era precisamente isso que José Sócrates pretendia demonstrar! Portanto, Passos Coelho deu um presente a José Sócrates!
b) Contudo, na nossa opinião, este momento foi um fait diver. O momento mais difícil para Passos Coelho foi a da comparticipação do serviço nacional de saúde: Passos Coelho, em vez de responder directamente a José Sócrates, deu a ideia de querer fugir à pergunta, falando dos desempregados e outras matérias, pedindo por duas vezes a Sócrates para não o interromper (enquanto ele pensava na resposta). É lentidão a mais! E Sócrates, que tem uma equipa de assessores muito profissional, levou cds, folhinhas, isto e aquilo para mostrar que ele é que diz a verdade. Aspeto curioso: Sócrates acusou de o líder do PSD de colocar em causa a sua palavra - mas foi Passos quem passou por mentiroso neste debate. Ora, politicamente, foi uma jogada de génio...
c) O grande problema de Passos Coelho foi apenas reagir -nunca agir. Nunca tomou a iniciativa, trazendo assuntos incómodos para o PS (e há muitos!) , limitando-se a responder a José Sócrates. Naturalmente que isso dá, desde logo, uma vantagem significativa ao líder socialista. Este era um dos dez mandamentos que Passos Coelho não cumpriu. Falta-lhe confiança política. Falta-lhe entusiasmo.
d) O melhor momento de Passos Coelho foi a reta final. Esteve muito, muito, bem na escolha de frase proferidas por José Sócrates a diabolizar o FMI. O mesmo FMI com quem José Sócrates teve (ou terá?) de trabalhar para evitar que o país ficasse na bancarrota! E este foi, correlativamente, o pior momento de José Sócrates: então, José Sócrates celebrou um acordo com a troika, terá de cooperar para as executar, quer ser chefe do Governo que as irá aplicar - e continua a criticá-las, dizendo que o país não precisava de ajuda externa? Estamos a brincar? O mesmo Sócrates que chama o FMI - diz que Portugal não precisa do FMI! Que ilusionismo político!
e) No domínio da legislação laboral, José Sócrates caiu no ridículo: a flexibilização do despedimento encontra-se no memorando - mas Sócrates diz que o Governo está a estudar. Isto é uma A-NE-DO-TA! Uma anedota! Só não nos rimos, porque é triste... E Passos Coelho respondeu razoavelmente, embora - mais uma vez! - lento na articulação do raciocínio.
3. No global, na forma, José Sócrates muito mais ágil, perspicaz politicamente, a atacar forte e feio; Passos Coelho mais lento, com, aqui e ali, tiradas certeiras, mas um pouco inócuas. É pena: ficamos com a ideia de que Passos poderia ter mais e melhor. Bastava ter cumprido os dez mandamentos que eu aqui avancei - não cumpriu nenhum. Infelizmente para Portugal...
Vamos às notas:
Debate - demasiado centrado no passado, com as frases e os argumentos do costume. Mas, de longe, o melhor debate - 14 valores;
José Sócrates - é um animal político, com uma grande presença televisiva, com a lição muito bem estudada - 13 valores;
Passos Coelho - nervoso no início, lento, muito redondo nas respostas, embora com críticas eficazes - 12 valores.
Em suma, vitória tangencial de José Sócrates. O que poderá acontecer? Veremos o que as sondagens mostrarão. Minha opinião: o PS, neste momento, tem uma ligeria vantagem. Mas o resultado parece certinho: empate técnico entre PS e PSD. "
in: Expresso
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