9 de março de 2011

Artigo de opinião: Isento, antipopular e abrangente.

"Todas as gerações estão à rasca. A que tem 20 e tais porque não arranja emprego, a que tem 40 e tais porque tem de sustentar a anterior, a dos 60 e tais porque se vê com umas reformas a diminuir e com o custo de vida a aumentar e a dos oitenta e tantos abandonada pelas mais novas que não estão para suportar os "velhos" ou porque simplesmente não se consegue suportar a si.

Sorrio quando me lembro do que pensava daqueles que diziam que iam para "letras". Já na minha geração isso era uma condenação a uma situação periclitante.

Os cursos de "ciências" por outro lado tinham empregabilidade. Como têm hoje cá e em qualquer outro pais.
Não é por acaso que há uns anos (não muitos) os EUA davam licença de trabalho para quem quisesse ir para lá com a formação na área das tecnologias da informação. Hoje é a Alemanha.

Mas nesses países não se pedem licenciados em Ciências Sociais ou em Relações Internacionais, cursos que abundam neste país e em que formaram muitos recém licenciados que à falta de melhor seguem pelos mestrados e doutoramentos. Sempre existem umas bolsas para isso e é melhor do que não ganhar nada.
Mas estão condenados a ficar por cá com pós graduações ou sem elas.

No ranking da empregabilidade os cursos de ciências não têm demasiados problemas. Ao contrário duma multidão de cursos cujo diploma não serve para quase nada neste mercado de trabalho deprimido e escasso.

Acresce ainda a isto o facto de não ser liquido que todos os licenciados tenham saído das universidades com uma formação adequada.

Veja-se o Direito, curso que proliferou por Universidades do país, públicas e privadas, e que hoje tem um excesso de licenciados. A ordem nem lhes quer dar hipótese de exercer. Formação deficiente argumenta.
E de facto há muitos já a exercer que nem português sabem escrever. É de fazer chorar as pedras ler documentos escritos por muitos advogados deste país. Quanto à competência técnica ou à simples capacidade de interpretação duma lei então nem se fala.

A incapacidade de escrever um simples texto. Algo que é muito comum nos dias que correm. A explicação de um conceito ou de uma ideia é na maior parte das vezes uma tarefa impossível.

E o que dizer do domínio de línguas estrangeiras que muitos demonstram? (estou também a piensar no niosso primeieiro ministro).

Numa acta de reunião vi escrito para o termo "ficou acordado" a tradução "it was awaken". É excelente saber que alguém estava acordado na reunião.

Isto seria impensável há 15 anos atrás. Não era possível tirar um curso sem o domínio básico da língua. Ou fazer um curso técnico sem dominar o inglês. Não só se exigia isso, como muita da bibliografia era em línguas estrangeiras. Toda a minha vida universitária se fez com livros em inglês e francês. Será que isso já não acontece hoje? Era inevitável dominar pelo menos o inglês.


Ao longo dos anos tenho assistido a uma degradação enorme nas pessoas que chegam ao mercado de trabalho. E piora inexoravelmente.

Também noto um sentimento de insatisfação pelo facto de a riqueza e o sucesso não chegarem depressa. Já não se espera por nada.

Há uma total incapacidade de perceber que quando se chega ao mercado de trabalho se é completamente "verde". São necessários anos de experiência para se ter o "traquejo" necessário para nos lançarmos a voos mais altos. Mas esta percepção não existe. A arrogância juvenil atribui esta incapacidade ao bloqueio feito pelas gerações mais velhas que simplesmente se querem "proteger".

Os empregadores têm uma enorme culpa nisto. Ao haver centenas de candidatos para um lugar, não se paga o salário justo. Paga-se o salário que um desesperado vai aceitar. E o esmagamento salarial é inevitável.

Com a globalização isso é ainda mais evidente. Em certas áreas o outsourcing consegue recursos fora do país a preços incríveis.

Primeiro foi o Leste e o Brasil. Já quase acabou a brincadeira nestes mercados, porque agora os bons são tão caros ou mais que os portugueses e têm mercados mais interessantes para trabalhar - Alemanha, França e UK.

Depois foi a Índia. Mas lá só ficou o que não presta ou na melhor das hipóteses o mediano. Os realmente bons foram para o Canadá, EUA e UK. Afinal é perfeitamente normal que eles queiram o melhor nível de vida possível e não é na India que o vão ter.

Estabelecido o patamar salarial que estes mercados criaram, aplica-se agora a receita a recém licenciados portugueses que perante uma inflação de "mãos" disponíveis no mercado aceitam qualquer porcaria que lhes apareça. E não têm outro remédio. O aceitar dessas condições causa um abaixamento salarial para todos.

É a média do mercado dizem eles. Saem da universidade e o máximo que podem aspirar são uns 1000 euritos por mês a fazer um trabalho que rende ao empregador 4 ou 5 mil nesse mesmo mês. E se conseguirem 1000 já vão cheios de sorte. Um indiano em IT ganha qualquer coisa como 150-200 por mês e as empresas vendem-nos a 250-300 por dia.

Entre pagar 1000 a um português ou 200 a um indiano, adivinhem quem é que a empresa vai escolher?

O problema não existe só cá. Existe um bocado por todo o lado, mas em Portugal tem uma expressão anormal.
E tem essa expressão porque há 20 anos atrás se começaram a criar Universidades como cogumelos. Que fizeram excelentes negócios e que largaram na rua milhares de "licenciados" sem qualquer perspectiva de futuro.

Legitimamente todos tinham aspirações de ter um canudo esquecendo-se que milhares como eles o iam ter todos os anos.

Hoje é isto que vemos. Não há cursos médios e há licenciados desempregados. Não se arranja um fulano que arranje uma canalização em menos de 2 meses mas há centenas de licenciados sem emprego a ir para a rua no dia 12.

Qual é a solução? Por todos os que têm mais de 45 anos na rua para arranjar emprego para todos estes jovens?

Se este fosse um país normal com uma taxa de desemprego de 4 ou 5% este problema não se punha mas perante o estado em que estamos o que é que é suposto fazer? Desempregar os que têm emprego para contratar estes a preço de saldo?

E não se esqueçam que o tempo passa a correr e por esta ordem de ideias quando esta geração estiver nos quarentas vai estar a geração dos vintes e fazer pressão para que eles larguem o lugar. Vou gostar de ver a maneira como se comportam perante esse "conflito" geracional.

Suspeito bem que vão fazer exactamente o mesmo que a geração que está hoje empregada e com 20 anos de trabalho faz - tentar manter o emprego e chegar ao fim do mês sustentando a família e um ou dois filhos no ensino superior.

Com sorte terá sabido incutir-lhes o conceito de empregabilidade aliado à vocação. Com sorte terá ajudado os filhos a estudar e conseguir entrar para um curso difícil. Com sorte não terá filhos em casa aos 35 anos para sustentar.

Com sorte terá mudado o mundo. Será justa e empática com os trabalhadores que deles dependem, pagará o valor justo pelo trabalho e será tudo aquilo que esta geração dos quarentas não é.

Veremos... Mas eu acho que vou esperar sentado. Já era isso que a minha geração dizia...."

in: O triunfo dos porcos

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