Uma parte da informação televisiva que se tem produzido em Portugal, nos últimos anos, oscila entre dois extremos que só aparentemente são opostos: o da obsequiosidade gelatinosa e o da agressividade espalhafatosa. Ambos os estilos pseudo-informativos convergem na violação qualificada de dois dos principais deveres deontológicos dos jornalistas, que são os deveres de objectividade e de isenção. Ambos consubstanciam um jornalismo parcial, cuja principal característica consiste em enaltecer artificialmente certos lados da realidade e/ou em desqualificar ou omitir outros.
Os expoentes mais visíveis desse tipo de jornalismo são Mário Crespo, na SIC-Notícias e Manuela Moura Guedes, na TVI. Os dois jornalistas prosseguem, há anos, implacáveis cruzadas contra certas pessoas, embora utilizando métodos diferentes mas que, na verdade, concretizam a mesma degenerescência deontológica: a parcialidade da informação. Mesmo quando aparentam alguma objectividade, um e outro acabam por só revelar uma parte da verdade ou então apenas a verdade de uma das partes.
A deliquescência voluptuosa com que Mário Crespo põe certas pessoas a agredir moralmente terceiros de quem não gosta só aparentemente contrasta com os insultos que Manuela Moura Guedes dirige, ela própria, àqueles que detesta. Em termos de deontologia jornalística não há diferença entre os dois métodos. A obsequiosidade de Mário Crespo revela, afinal, a mesma parcialidade que a agressividade de Manuela Moura Guedes. Se a jornalista da TVI se apresentava em muitos aspectos como uma emanação reciclada do velho estilo Palma Cavalão, o pivot da SIC-Notícias não passa de um comentador travestido de jornalista, que faz por interpostas pessoas o que aquela fazia pessoalmente. Os dois actuam quase sempre segundo agendas próprias de interesses, sobretudo políticos, que tentam ocultar atrás do biombo da informação: num caso, o Jornal da Noite da TVI, e, no outro, Jornal das Nove da SIC-Notícias.
Mas vejamos algumas pérolas desses estilos: em Abril de 2009, fui convidado para ser entrevistado por Manuela Moura Guedes no Jornal da Noite. Era uma armadilha montada em conluio com alguns dos meus opositores dentro da Ordem dos Advogados. De boa fé, aceitei o convite e fui insultado em directo. O episódio é bem conhecido e não vale a pena acrescentar mais pormenores. Basta apenas referir que, apesar de tudo, tive oportunidade de lhe responder e de lhe dizer cara a cara o quanto ela violava o Código Deontológico dos jornalistas.
Pouco tempo depois, em 19 de Maio seguinte, na SIC-Notícias, fui alvo de agressões ainda maiores, não por qualquer jornalista da estação, mas sim por entrevistados cuidadosamente seleccionados. A propósito do Dia do Advogado, a SIC-Notícias convidou sucessivamente para os principais programas de informação dessa noite dois dos meus mais destacados opositores na Ordem dos Advogados. Sem qualquer hipótese de defesa, fui moralmente seviciado, em directo, por ambos os adversários, sobretudo pelo convidado de Mário Crespo, sem que nunca me tivesse sido dada qualquer possibilidade de rebater as pérfidas acusações de que fui vítima.
Mas os exemplos não ficam por aqui. Nas anteriores eleições para o Ordem dos Advogados, havia quatro candidatos a Bastonário: Menezes Leitão, Magalhães e Silva, Garcia Pereira e eu próprio. Pois Mário Crespo conseguiu esta notável proeza de «imparcialidade»: entrevistou duas vezes o candidato Magalhães e Silva e não entrevistou nenhuma vez qualquer um dos outros candidatos.
Ainda mais um exemplo que ilustra bem como em jornalismo algumas mentiras são feitas de silêncios. Posteriormente, Mário Crespo convidou um advogado para o seu programa (por sinal um dos dois que estivera na SIC-N no Dia do Advogado) a quem, a dada altura, pergunta candidamente se concordava com a existência de sindicatos nas magistraturas. O entrevistado responde, ainda mais candidamente, que sim, porque os magistrados também seriam trabalhadores. Mas o que ambos omitiram é que o entrevistado era, simplesmente, o advogado de um dos sindicatos de magistrados, de quem, obviamente, a última coisa que se esperaria era que defendesse a não existência de um cliente seu.
Este é, pois, o cintilar de algumas das mais refulgentes vedetas de alguns dos mais esplendorosos programas de informação televisiva em Portugal. Um jornalismo não de referência, como pretende certa propaganda, mas um jornalismo notoriamente de reverência para com certos interesses ou pessoas.
In: JN - Marinho Pinto
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