21 de abril de 2010

"Receber para não trabalhar"

Lia-se na manchete do JN de sexta-feira que "ficar em casa dá mais dinheiro do que trabalhar", pela simples razão de que os desempregados receberam em média um subsídio mensal de 532 euros, enquanto os salários oferecidos nos centros de emprego andaram nove euros abaixo. Há qualquer coisa de errado nisto e, se Governo e parceiros sociais não se puserem de acordo para mudar as regras do jogo, nada de bom acontecerá. É preciso dizer, porém, que se Governo, Oposição e parceiros sociais não chegarem a um consenso, é obrigação do Governo impor novas regras.

Os desempregados merecem, obviamente, todo o apoio da comunidade, mas não é aceitável que, crescendo o desemprego para os níveis assustadores a que está a crescer, tenham ficado, em 2009, 18 mil empregos vagos nos centros de emprego. Há mais de meio milhão de pessoas sem trabalho, a quarta parte das quais não recebe um único cêntimo do Estado, ou porque não trabalhou o tempo suficiente para garantir subsídio ou porque já o esgotou. Significa, isto, para se ter uma ideia da dimensão da crise, que há muitas famílias onde a palavra solidariedade não é um conceito vago e é a principal garantia de sustento no dia-a-dia.

O país precisa de gastar menos mas sobretudo de produzir mais e melhor. Ora, o que acontece é que o Estado faz um esforço grande para pagar os subsídios sociais, verificando-se, em contrapartida, que há casos de gente que prefere acomodar-se ao pequeno subsídio que lhe é dado em vez de, como se costuma dizer, se fazer à vida, aceitando o que aparece e batalhando por melhor.

No mesmo dia em que aquela manchete era publicada, no nosso online, uma jovem contava o seu caso: aceitara um trabalho longe de casa por 450 euros a recibos verdes mas, entretanto, progrediu e melhorou consideravelmente a sua vida. Sortes - dirão alguns. É verdade. Infelizmente sabemos que há muito patrão gozando o remanso da crise: oferecem-se salários baixos, condições ignominiosas e corta-se o vínculo ao mais pequeno sinal de enfraquecimento do mercado. O que isto significa é que as instâncias do Estado devem estar atentas quer aos que vão recusando emprego e sobrecarregando a Segurança Social, quer aos que violam constantemente as regras de contratação seguindo impunes na imposição de regras e condições inaceitáveis.

A sugestão, quer do PSD quer, anteriormente, do CDS, de obrigar os que recebem subsídios estatais a prestar serviços cívicos à sociedade tem de bom o deixar claro que o cidadão que recebe deve, por via disso, se tiver saúde, prestar um serviço que atenue o esforço que a comunidade faz por si. Não se trata de uma punição, mas de um bom princípio. Mas tem de de bom também a possibilidade de mostrar melhor os casos em que há abusos no recebimento dos subsídios. A atribuição de subsídios é uma questão muito sensível, mas da forma como a resolvermos reside parte do sucesso que poderemos ter no combate à crise. E isso não significa, como é óbvio, sacrificar os mais fracos. Significa, "apenas", mudar mentalidades.

in: JN - José Leite Pereira

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